domingo, 30 de janeiro de 2011

II- Dentro

A soleira da porta molhada, e pés vacilantes adentrando a casa. Ele vacilava de expectativa, pois o medo já o havia abandonado a muitos anos, mas a expectativa de reencontrar a quem procurava deixava-o tenso, e até mesmo feliz, mesmo sem saber o resultado daquela situação.
O Hall estava escuro, silêncio total o cercava, e com seus olhos treinados observou o ambiente, uma porta que parecia ser a de uma cozinha estava entreaberta, e outra a sua direita aparentando levar a uma sala estava fechada. Uma enorme escada em situação horrivel insinuava-se a sua frente. Teria que escolher. Preferiu seguir seus instintos.
Assim que pisou o primeiro degrau da escada, seu rangido o surpreendeu, e ele parou no mesmo instante, sabia que sua presença havia sido notada, porém nada aconteceu. O segundo passo no degrau seguinte também fez um pouco de barulho, mas não o assustou, continuou a subir, mesmo que soubessem onde ele estava.
No alto da escada viu um longo corredor, e a luz de mais um relampago entrou por uma janela,  iluminando pequenas manchas escuras no chão. Aproximando-se dessas manchas assegurou-se que eram o que pensava, sangue. Alguém lutara, pois marcas estavam expostas nas paredes de ambos os lados, sinais de luta e objetos quebrados. Respirou profundamente, esperando que o sangue ali presente não fosse de quem procurava. Uma das portas do corredor estava aberta, e o batente da porta marcado por sangue chamou sua atenção, ele entrou.
O quarto era comum, cama, criado-mudo, abajur, não mostrava nada muito diferente, a única coisa que notou destoar com o ambiente era um tapete desarrumado aparentando ter sido arrastado, e com algumas marcas avermelhadas, estava próximo ao closed.
Seus pés ainda estavam molhados, e ao caminhar no assoalho os rangidos, leves, ainda podiam ser ouvidos. Segurou com cuidado a maçaneta, alguém poderia estar lá dentro. Seu coração não acelerou, estava condicionado aquele tipo de situação, esperava sempre o pior, e era o que recebia na maioria das vezes. Abriu a porta, mas não pode ver nada, estava muito escuro, procurou onde acendia a lâmpada, mas a casa toda estava sem eletricidade. Mais um relampago rasgou a noite e por poucos segundos pode ver o que tinha a sua frente. Não conseguia acreditar no que havia visto.

domingo, 23 de janeiro de 2011

I- Essa Noite

A chuva caia insistentemente, e os trovões abrangiam toda a noite, como gritos do inferno a nos lembrar que a noite não é habitada por tolos. Os passos pesados encharcados pela aguá não eram ouvidos, as únicas presenças naquela rua eram do caminhante, e da grossa tempestade.
Movendo-se com rapidez ele parou diante da soleira do único sobrado habitado, a cidade estava praticamente vazia desde que as mortes haviam começado. A cada noite que findava-se novos corpos eram encontrados nos becos e nas marquises, impossíveis de serem reconhecidos devido a brutalidade dos ataques. O desespero e o pânico eram evidentes no semblante dos sobreviventes, e aqueles que permaneciam vivos, esgueiravam-se escondidos para não se transformarem nas próximas vitimas de uma desgraça coletiva.
Ele permanecia parado diante da maciça porta do sobrado, seu olhar fixo não demonstrava qualquer reação, impossível prever seu próximo movimento, o barulho da chuva caindo sobre seu grosso casaco de couro criava a impressão de que era uma estátua, imóvel, indiferente ao mundo que o cercava.
Uma luz acendeu-se, e seus olhos faiscaram com a surpresa. Passos podiam ser ouvidos aproximando-se da porta, passos mais leves, vindos de alguém que talvez tivesse notado uma presença do lado de fora.
Os passos cessaram, e um abafado suspiro pode ser escutado, seguido de passadas pesadas arrastando consigo alguma coisa que não queria ser arrastada. A luz se apagou. Uma raio rasgou a noite e iluminou a janela da frente, uma silhueta monstruosa pode ser vista, porem logo foi engolida pela escuridão.
Ele caminhou até a porta, e decidiu adentrar.