terça-feira, 22 de maio de 2012

O Corvo, Edgar Allan Poe

Conto

Era uma vez eu refletia, à meia Noite erma e sombria a ler doutrinas de outro tempo em curiosos manuais, e exausto quase adormecido, ouvi de súbito um batido, tal qual houvesse alguém batido em meus umbrais.
-É um visitante que vem bater em meus umbrais é só isso e nada mais.
Ah! Claramente eu relembro! Era no gélido dezembro e o fogo agônico pintava o chão de sombras espectrais.
Ansiando em ver a noite finda, em vão a ler buscava ainda algum remédio a amarga, infinda, atroz saudade de Lenora – Essa mais bela que a aurora, a quem os céus chamam Lenora e nome aqui já não tem mais.
A seda rubra da cortina arfava em lúgubre surdina, arrepiando-me e evocando medos sepulcrais.
De susto o coração batia e a sossega-lo eu repetia: “É um visitante que pede abrigo em meus umbrais apenas isso e nada mais”
No momento em que me senti forte sem hesitar lancei a sorte: “Senhor ou então senhora perdoai-me se muito me esperais mais é que estava adormecido e tão débil o batido que mau podia ter ouvido alguém bater em meus portais assim de leve a horas tais” Escancarei então a porta: - Escuridão e nada mais.
Com a alma febril, eu novamente entrei no quarto e de repente o ruído recomeça e resoa em meus vitrais. Com certeza é na janela vamos ver o que esta nela e ao mistério dar finais. Abro a janela e eis que surgi, em tumulto, a esvoaçar, penetra um vulto: - é um corvo hierático e soberbo, egresso de eras ancestrais.
Como fidalgo passa, augusto, e, sem notar sequer meu susto, adeja e pousa sobre o busto que se encontra em meu umbrais bem sobre pórtico e lá se instala sobre a cabeça de Palas que se encontra em meus umbrais empoleirado e nada mais. – Sem crista embora digo ao corvo não tens pavor antigo e singular amigo que na noite me pede abrigo diga-me qual é teu nome o nobre corvo o nome teu no inferno torvo – e o corvo disse – Nunca mais.
O ar pereceu-me então mais denso e perfumado qual se incenso, ali descessem a espargir turibulários celestiais.
- Mísero – exclamo – Enfim teu Deus te dá, mandando os anjos seus a esquecimento para a saudades de Lenora.
Sorve o nepentes. Sorve-o, agora! Esquece, olvida essa Lenora!
E o corvo disse – Nunca Mais.
- Sejam palavras da nossa despedida ave de agouro – Ergo-me em gritos - volta de novo a tempestade aos negros antros infernais! Nem leve pluma de ti reste , que tal mentira ateste, deixa-me só neste ermo agreste, sai do busto em meus portais retira o bico que me fere o peito alça vôo e deixa meus umbrais – e o corvo disse – Nunca Mais!!.
Retira o bico que me fere o peito alça vôo e deixa meus umbrais – e o corvo disse – Nunca mais.
E lá ficou! Hirto e sombrio, ainda hoje o vejo, horas a fio, sobre o busto pálido de Palas, inerte, sempre em meus umbrais.
No seu olhar medonho e enorme o anjo do mal, em sonhos, dorme e a luz da lâmpada, disforme, atira ao chão a suas sombras imortais, nelas que ondulam sobre a alfombra, está minha alma e presa à sombra não há de erguer-se nunca mais!!!
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segunda-feira, 14 de maio de 2012

Gótico Americano

A expressão "gótico americano", que costuma abranger de Washington Irving
(1783-1859) a Stephen King (1947) é mais uma etiqueta reconhecível e sonora do
que uma informação sólida e interpretativa sobre um grupo de autores.
Essa etiqueta costuma portanto abarcar a produção de contos fantásticos, de
vários subgêneros do já subgênero "terror", escrita por autores dos Estados
Unidos. "Gótico" porque tomado como leitura romântica de uma idéia de
"medieval", em que se possa imaginar um estilo de traços muito largos,
sugerindo com o nome um ambiente mental duvidoso, fruto de superstições e,
portanto, repleto de medos sobrenaturais .
Especialmente o século XIX gerou as narrativas "góticas" americanas, que
formaram a base dessa investigação do escabroso, que definiu até mesmo boa
parte do cinema dos Estados Unidos no século XX, como sabemos. 
Mas é interessante saber também que inicialmente os autores dos EUA pareciam
ter dificuldade em encontrar uma imaginação de "sombra e mistério" que os
diferenciasse do que já se fazia na Europa - principalmente em alemão e
francês - como o crítico Allan Lloyd-Smith escreve:
[Fenimore] Cooper se queixava em 1828 de que não havia materiais adequados
para escritores no novo país, "não há anais para historiadores ... não há
ficções obscuras para o escritor de romance". Sua impressão de dificuldade em
encontrar sustento imaginativo seria endossada por Hawthorne, que escreveu, em
1859, sobre a "ampla e simples luz do dia" e a "prosperidade sem graça" deste
país (...) Sem um passado feudal e as relíquias tão convenientes ao gótico
europeu, castelos, mosteiros e lendas, a paisagem americana parecia um lugar
improvável para tais ficções.