domingo, 20 de fevereiro de 2011

V- Escolhas

O tempo havia lhe tornado calejado, um sexto sentido mais apurado fazia-o sentir o clima diferente que o circundava, por muito tempo tentara calar essas impressões, porém descobriu que poderiam servir como um fator positivo, essas chamadas impressões haviam lhe salvado a vida inúmeras vezes. Agora esse alerta estava ligado, tinha alguma coisa errada.
Liz se desprendeu de seus braços, e agora estavam dentro de uma sala escura, algumas armaduras medievais estavam dispostas próximas as paredes, objetos muito antigos, castiçais, espelhos, quadros, esculturas, com certeza o caminho não era aquele. Passou a mão na cintura e lembrou-se que estava sem sua arma. Teria que lutar apenas com sua habilidade e conhecimento, colocando-se em posição de defesa esperou.
Escutava a respiração de Liz na mesma sala, e um murmúrio que parecia choro. Aos poucos ele tentava entender aquela situação, afinal, o que estava acontecendo? A porta por onde entraram se iluminou brandamente, uma imagem se formava. Seus instintos não o haviam enganado.
Os olhos vermelhos como duas chamas eram vistos com facilidade, a pele alva e translúcida, não era belo, era assustador, uma figura com aparência animalizada mas que carregava no semblante resquícios de uma vida humana esquecida. Adentrou a sala segurando um archote parecido com o que foi encontrado na entrada do subsolo. A criatura colocou-o na estrutura da parede e aproximou-se um pouco mais devagar. Agora ele podia ver Liz em um canto, com os braços cruzados no peito como se estivesse abraçando a si mesma, ou segurando-se para não ir até onde ele estava.
Liz falou com a criatura, chamando-o de Philipi e lembrando-o do que havia sido combinado. Lembrou-o de sua promessa, que não machucaria aquele que a procurava, faria isso por ela.
Tudo estava muito confuso, o que significava tudo aquilo? O que Liz estava fazendo ali? Que tipo de acordo era esse entra ela e esse tal Philipi? Mesmo sem entender ao certo, ele manteve-se em posição de defesa e estava pronto para agir, porém Liz antecedeu-se com palavras. Contou-lhe que ela era como Philipi, e que já fazia algum tempo que queria lhe contar a verdade, porém sabia que ele não entenderia, e achou melhor atrai-lo até o local onde se reuniam para lhe mostrar a verdade ao invés de contá-la. Os olhos de Liz eram tão vermelhos como os de Philipi, e agora sua postura era diferente, não era mais a garota indefesa que aparentava a poucos minutos atrás. Ela caminhava em círculos ao redor dele, contando-lhe aos poucos sua história, mas ele não expressava nenhum sentimento. Philipi o encarava, e disse para que Liz fosse breve, pois era arriscado prolongar uma situação como aquela.
Liz aproximou-se esticando-lhe uma das mãos pedindo a ele que se juntasse a ela, o propósito de tudo aquilo era torna-lo como eles. Liz havia convencido Philipi que um aliado com um potencial tão grande seria perfeito, pois teriam um caçador trabalhando do lado oposto, a proteção da raça estaria garantida.
Philipi sorriu ironicamente, dizendo para Liz que a raça nunca seria extinta, não eram tantos como antigamente, mas ainda existiam em um numero considerável, que assim como ela viviam uma vida quase real, escondidos em trejeitos humanos, usando de múltiplas personalidades para a sobrevivencia. Eram inteligentes, haviam sobrevivido durante séculos, não precisavam de nenhum caçador, era um erro o que ela queria. Liz grunhiu para Philipi, dizendo-lhe que ela queria daquela forma, e que não aceitaria nada diferente do que ela já havia planejado.
Ela estava discutindo por causa dele? O que ela pensava? Que ele aceitaria fazer parte dessa raça? Por anos lutara contra tais criaturas e agora se renderia a elas? Por Liz? Ele sabia que teria que se posicionar perante aquela situação, e ainda questionava-se quanto ao que fazer, mas o que era certo e errado? O que fazer quando quem se ama não é quem se ama de verdade? O que era de verdade?
Liz aproximou-se dele um pouco mais, e lhe disse que ficaria tudo bem, seria tudo muito rápido (como se ele não soubesse), e pediu que ele a deixasse abraça-lo. Liz se aproximava com cautela, e ele afastou-se bruscamente, Philipi gargalhou. Liz tentou mais uma vez, e ele olhou a sua volta, procurando...ela se aproximou e ele foi se afastando até que em suas costas encontrou um obstáculo. Pela primeira vez ele falou com Liz, e pediu que ela não o fizesse sofrer mais. Ela concordou, e pela ultima vez tocou o rosto dele com delicadeza, e ele pode ver nos olhos escarlate que aquela não era a sua Liz, quem ele amou não existia.
Liz virou-se para Philipi, e com um singelo sorriso lhe disse que seu plano iria dar certo. Os olhos de Philipi que eram de prazer, subitamente se modificaram e Liz pode ver a expressão de surpresa em seu semblante, o mundo estava em câmera lenta enquanto tentava entender o que acontecia.
Os anos de experiência caçando criaturas como Liz haviam lhe deixado preparado para o inesperado, e a espada enferrujada de uma das armaduras era a única forma de defesa, e sem pensar muito nas consequencias ele a empunhou quando Liz se virou (amadora), e em um único golpe desferido, decapitou-a, matando juntamente uma parte de si. Porém a parte ainda viva em seu coração não permitia trair sua consciência, era o certo a ser feito, para isso havia sido treinado, para momentos como aquele, onde a razão supera a emoção. E mesmo ferido de morte emocionalmente, empunhou a espada com mais firmeza. Philipi havia desaparecido.

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