domingo, 10 de abril de 2011

II- A CAIXA

Pam crescia. Não havia pai, mãe ou qualquer outra pessoa que a houvesse procurado. Por muito tempo os irmãos Eddy e Paul esperaram e até mesmo buscaram alguém que soubesse alguma coisa da menina, porém ninguém a conhecia, era como se ela não existisse, como um presente caído do céu, sem origem definida ou qualquer indicação de onde teria vindo. Então eles pararam de procurar, Pam já era parte da vida de Eddy, era melhor não esperar por ninguém. Os dias passando e seu carinho e amor pela criança cresciam juntamente. Alguns anos transcorreram como dias. Quando Eddy se preparava para o aniversário de sete anos de Pam, percebeu que ela era sua, e que ninguém mais a tiraria dele. Pam era muito especial, uma criança bem diferente das demais. Parecia que tudo o que ela tocava se transformava, era uma menina abençoada, pelo menos era assim que era vista por Eddy e Paul. A música era uma de suas habilidades, tocava violino com maestria, e sua voz era um canto aos Deuses quando entoava as canções que mais gostava. Poderiam observa-la por horas,e ela poderia também cantar horas a fio, adorava ser admirada.
Os canteiros de flores ao redor da casa estavam sempre floridos, as pequenas mãos da menina eram capazes de modificar até mesmo a ordem natural das flores, pois desde que começou a cuidar do jardim, as flores nunca mais abandonaram a sua companhia. Pam era iluminada, os olhos de Eddy a idolatravam, não era mais capaz de viver sem ela.
Certo dia foram passear perto da represa que ficava já nos limites da cidade. Paul e sua garrafa de conhaque também estavam presentes. Embriagado ele decidiu nadar, e chamou Pam para acompanha-lo. Eddy não queria, afinal a menina ainda era muito pequena, mas não teve como dete-la, quando percebeu ela já estava as margens da represa preparando-se para mergulhar. Paul de dentro da água chamava pela menina que sem medo atirou-se em sua direção. Ela afundou. E não subiu até a superfície mais. Desesperado Eddy correu para atirar-se em busca de Pam, mas quando estava perto de se jogar, ela aparece sorrindo na superfície segurando um colar de pérolas e gritando eufórica que o havia encontrado no fundo. Pam sabia nadar, ela não afundava, boiava ao lado de Paul, mas eles não sabiam como ela havia aprendido, afinal era a primeira vez que mergulhava em águas tão profundas. Tudo com ela parecia simples E era, muito simples.
Naquela tarde Eddy recebeu um telefonema. Era do hospital central, alguém havia dado o seu telefone como contato, mas não era possível dizer o motivo, seria necessário ir até lá. Pegando Pam rapidamente, Eddy foi depressa ao centro da cidade, precisava saber do que se tratava aquele telefonema.
Quando chegou foi informado de que se tratava de seu irmão Paul, que havia sido internado em estado grave devido a uma doença no fígado, causada pelo alcoolismo. O médico o informou que o caso de Paul era muito grave, seu fígado estava gravemente comprometido, mesmo que houvesse alguma maneira de recuperação já era tarde, não havia mais tempo.
Paul morava na metalúrgica onde trabalhava, seu trabalho desgastante e sua solidão faziam com que ele procurasse conforto na bebida, e foi assim por longos anos. Eddy sabia que o irmão não levava uma vida muito saudável, mas nunca o importunou com suas opiniões, achava que não tinha o direito de cobrar nada. Mas era muito doloroso saber de forma tão inesperada que seu irmão estava condenado.
Quando Eddy entrou no quarto em que seu irmão estava pode ver a situação real de Paul, o abatimento, a melancolia, o arrependimento, a tristeza que o envolviam. Teve pena, mas não poderia dizer isso. Pam soltou as mãos de Eddy e correu ao encontro de Paul. Este sorriu para a garotinha, e pediu que ela deitasse ao seu lado no leito. Pam deitou-se e com os olhos marejados perguntou com toda docilidade:
- Você vai morrer?
Paul sorriu, e disse que não, não agora. Seus olhos se encontraram com os de Eddy, e diziam o inverso daquilo que Pam acabara de ouvir. Levantando-se bem devagar, tentando deixar o corpo um pouco mais ereto na cama, Paul disse:
- Pam, vá comprar uns doces naquela maquina do corredor pra mim?
- Vou, mas posso comprar pra mim também? - disse a menina com o olhar de piedade já preparado.
- Claro que pode, pegue o dinheiro aqui com o Eddy.- disse Paul colocando a mão nos bolsos do irmão em busca de alguma moeda. Eddy porém não perdia o mal-humor e resmungando retirou algumas moedas e entregou a Pam, que saiu correndo em busca dos doces.
- O que você tem prá me dizer? - perguntou Eddy- É algo que Pam não pode saber, mas o que é?
Com o semblante sério, Paul disse com cuidado:
- Preciso que você esconda algo para mim.
- Você não toma jeito mesmo, nem doente e acamado você deixa de arrumar confusão! Não me conte nada, não quero nem saber das suas trapaças e confusões, me deixe fora dessa!- irritado disse Eddy.
- Não é nada disso, é coisa séria. Você precisa esconder uma coisa prá mim, é muito importante.
- Esconder? Coisa boa é que não deve ser! É alguma coisa roubada?- perguntou o irmão.
- Nada disso! Eu devia ter te contado antes, mas não tive coragem, agora escute. Preciso que você guarde uma caixa para mim.- disse Paul com todo o cuidado, e continuou- É muito importante que você a esconda bem e não deixe ninguém abri-la, nem mesmo você, nunca, por nenhum motivo no mundo, nunca, jamais abra a caixa.
- Tá, mas o que tem nessa tal caixa? - perguntou Eddy curioso.
- Eu não sei, eu não abri.
A risada estridente de Eddy quebra o clima silencioso e em um rompante de ironia ele diz:
- Você quer que eu esconda uma caixa que nem você sabe o que tem dentro, e não quer que eu saiba também? É isso?
- Sim, é isso.
- Ah! Fala sério! O que tão te dando nesse soro aí? Vodka?- disse Eddy rispidamente.
- Tá eu sei que parece estranho, mas é a última coisa que te peço, você sabe que eu não vou voltar.- a voz de Paul rouca trouxe o clima silencioso de volta.- Preciso de você, é a última coisa que lhe peço, se não quiser fazer por mim, faça por Pam.
- Afinal, do que você está falando? O que Pam tem haver com essa tal caixa? Não estou gostando dessa história, me fala logo o que tem dentro da caixa vai!
Pam abriu a porta sorridente, e com as pequenas mãos sujas e cheias de doces, correu até o leito de Paul e colocou todos os doces em cima de sua barriga.
- Pronto, pode escolher, o que você não quiser pode deixar que eu como.- disse a menina com um doce na boca.
Paul olhou para Eddy, e não era preciso dizer mais nada, os olhares simplificavam o diálogo.
- Vamos Pam, Paul precisa descansar depois a gente volta.
A menina beijou-o e saltando da cama saiu correndo porta afora.
- Eddy, por favor!- suplicou Paul.
- Que saco! Diz logo onde está a droga da caixa!

Nenhum comentário:

Postar um comentário