sábado, 26 de março de 2011

5- Face a face

O que estava acontecendo? Aquela era a voz de Mike, mas Susan não conseguia entender porque ela estava escutando seu nome, e não entendia como aquela sombra escura em frente a sua porta poderia ser o seu marido. Ela reconheceu o semblante, não era engano, aquele homem parado na sua porta que a encarava era Mike. Seus sentidos a estavam enganando, sentindo muito medo, Susan respondeu:
- Sim querido, sou eu. Me diga o que você quer, eu irei te ajudar.
As lágrimas escorriam pela face já cansada, apesar de muito amedrontada com o momento vivenciado, ela tentava manter os pensamentos claros, por mais difícil que fosse aquele instante, teria que ser forte e não deixar que o pânico a envolvesse novamente. Era Mike, sempre foi ele.
A voz que a interrogou novamente não carregava nenhum peso, não parecia de dor ou sofrimento, e Susan sentiu-se mais confusa.
- Eu quero que você pare, não pode mais continuar assim. Chega.- a voz do marido ecoava em seus ouvidos, como a muito tempo ela não escutava.
- Tudo bem, eu faço o que for preciso para que você siga seu caminho em paz, mas não assuste nosso filho, ele está dormindo.- A voz tremula de Susan demonstrava seu medo e sua fraqueza. Nunca havia acreditado que coisas assim pudessem acontecer, não era uma pessoa religiosa, nem sequer pensava na possibilidade de vida após a morte. Por ser muito racional acreditava no que seus sentidos lhe mostravam, o que pudesse ver, o que pudesse ouvir. Sua vida sempre fora pautada no real, no material e na razão. Esse fenômeno que já algum tempo a perseguia agora era explicado, mesmo que ela duvidasse, seus sentidos não a enganariam, tudo aquilo estava realmente acontecendo. E como que hipnotizada prestava muita atenção nas palavras daquele homem que ela tanto amara.
- Já estou cansado Susan, o acidente aconteceu há dois anos, você precisa superar a perda e continuar sua vida. Eu lhe peço por favor, volte a viver.- As palavras de Mike estavam carregadas de compaixão, ele não queria ver mais a esposa em uma situação tão deprimente.
-  Eu estou tentando, mas ainda é muito difícil. Não tenho forças, sinto muito a sua falta, sua ausência me machuca, não consigo me libertar das suas coisas, por onde eu ando sinto sua presença, e ainda tem o Josh. Não quero que ele sofra como eu, preciso cuidar dele, mas me sinto muito só. Por que Mike? Por que tudo aconteceu dessa forma?- A angustia estava presente em sua fala, e tropegamente ela se levantou, indo aos pés da cama e deixando-se cair no chão, chorando aos soluços.
- Estou exausta, continuo viva ainda somente porque amo muito meu filho para abandoná-lo.- disse Susan.
Caminhando até perto da esposa, Mike abaixo-se e segurou-a pelos ombros. Levantou-a até sua altura e abraçou-a com força, chorando com ela.
Susan parou, ele a estava abraçando. Sentia seu corpo, o calor da sua pele, seu cheiro, estreitou ainda mais os braços para ter certeza de que não estava sonhando. Aquele era Mike, seu Mike.
- Você voltou, mas...como pode ser? Você morreu naquele acidente! Você mentiu pra mim? - ela tentava entender como era possível tudo aquilo.
- É hora de parar querida, te peço mais uma vez, viva sua vida e aceite a perda.
- Mas que perda, você está aqui, comigo! Vivo!- A empolgação a dominou ela não percebia o que Mike queria dizer.- Venha, vamos acordar o Josh, ele precisa ver você também!
- Querida, não podemos acordar o Josh.
- Podemos sim, venha, ele vai ficar tão contente! Vamos Mike, vamos!
Mas Mike não se movia, e segurando Susan com firmeza, olhou-a bem dentro dos olhos e disse:
- Josh morreu há dois anos no maldito acidente de carro! Nosso filho está morto!
Aquelas palavras percorreram todo o corpo de Susan, e como se acordasse de um transe sua memória reabilitou-se e emergindo de seu íntimo lhe trouxe a lembrança que estava enterrada em sua consciência.
Mike voltava com Josh de uma partida de futebol, a criança sentada no banco traseiro brincava com o pai de adivinhações. A chuva fina que caia baixou a temperatura, fazendo com que Mike, por poucos segundos desviasse a atenção da estrada para pegar um agasalho para o filho no banco ao seu lado. Os poucos segundos bastaram para que um carro vindo em direção contrária não fosse visto a tempo, fazendo com que o carro de Mike perdesse o controle e capotasse repetidas vezes. Josh morreu na hora, e o pai permaneceu internado por duas semanas até se recuperar. Susan lembrou-se de tudo.
- Não!!!! Josh estava aqui comigo!!!! Ele estava!!!!!- ela gritava enlouquecidamente.
- Não querida, ele não estava. Chega, está mais do que na hora de você aceitar. Ele se foi!
Agora tudo fazia sentido, o barulho, as sombras, sempre foram Mike. Mas e Josh? Ele também esteve lá. Quanto mais tentava entender mais confusa se sentia, o que havia sido real?
Em um ato de desespero Susan correu para o quarto do filho, abrindo a porta com violência deparou-se com o vazio. Apenas a cama e uma poltrona. Sem brinquedos, sem roupas espalhadas, sem nada.
- Meu filho não!!!!!- aos prantos foi tudo o que ela conseguiu dizer.
Mike entrou no quarto, e abraçando a mulher tudo o que conseguiu fazer foi compartilhar de seu desespero.
A dor era tamanha que envolvidos no pranto não perceberam, que da porta alguém os observava.


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